sábado, 12 de abril de 2008

Resenha do capítulo O conhecimento inútil, de Bertrand Russell

Boa tarde!
Aí vai a resenha d'O conhecimento inútil + um breve comentário acerca do A luta pelo significado.
Um excelente final de semana!!
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RUSSELL, Bertrand. O conhecimento inútil. IN: -------. O elogio ao ócio. Rio de Janeiro, Sextante, 2002. p.36-46.

Bertrand Russell publicou seu livro In praise of idleness em 1935. A editora Sextante traduziu-o publicou-o como O elogio do ócio em 2002. O intervalo entre as edições é de 67 anos. Uma vida, eu diria. É impressionante como certos fenômenos são tão duradouros e o quanto certas obras, apesar de escritas há tanto tempo, permanecem tão relevantes.

Neste capítulo (O conhecimento inútil), o autor traça um rápido histórico da visão do valor do conhecimento, da Renascença até o século XX (mais especificamente o período entre-guerras).
Segundo ele, na Renascença:


"a instrução fazia parte da alegria de viver , tanto quanto beber ou amar (...) A principal causa da Renascença foi o prazer mental, a restauração de uma certa riqueza e liberdade na arte e na especulação..."
A seguir ele nos lembra de que a partir do século XVIII até o momento em que ele escreveu o livro (eu me arriscaria a dizer que até agora):
"Em toda parte o conhecimento vai deixando de ser visto como um bem em si mesmo ou como um meio de criar-se uma perspectiva de vida humana abrangente e se transforma em mero ingrediente da aptidão técnica (...) Não temos, portanto, tempo mental para adquirir outros conhecimentos além daqueles que hão de nos ajudar na luta pelas coisas que consideramos importantes."
Claro que o autor também defende o conhecimento "útil", afinal, foi isso que trouxe o progresso, a melhoria da saúde, etc. Em suma , foi o conhecimento "útil" que moldou a sociedade atual, no que ela tem de bom e de ruim. O que ele defende é o equilíbrio entre o conhecimento "útil" e "inútil" (aquele que não contribui para a eficiência técnica), afinal, utilidade e cultura, quando concebidas de forma abrangente, são compatíveis.
O autor afirma que o conhecimento "inútil" possui diversas formas de utilidade indireta. Ele crê que muitos aspectos negativos do mundo atual seriam minimizados se a obtenção de conhecimento "inútil" fosse mais incentivada.
Vejamos:
ASPECTO NEGATIVO DA MODERNIDADE // BENEFÍCIO DO CONHECIMENTO INÚTIL
1. Trabalho exagerado que leva ao desequilíbrio // Lazer que seria antídoto deste exagero
e distúrbios nervosos
2. Lazer passivo // Lazer como prazer mental
3. Egoísmo / crueldade // Ocupação de temas amplos e impessoais e busca de formas menos nocivas e se buscar poder e fama
4. Ativismo sem discernimento // Atitude mental contemplativa
5. Vida confinada ao estritamente pessoal // Substituição das religiões dogmáticas na busca de sentido da vida
Neste último tópico, o autor afirma:
"O que se necessita é de um conhecimento que inspire uma concepção da finalidade da vida humana como um todo: arte e história, familiaridade com a vida das pessoas heróicas, além de um certo entendimento da posição estranhamente acidental e efêmera do homem no cosmos - tudo isso permeado do sentimento de orgulho daquilo que é distintivo do ser humano: o poder de ver e conhecer, de sentir com magnanimidade e de pensar com entendimento"
Esta afirmação é muito próxima da afirmação de Bruno Bettelheim(1), quando este diz:
"Se esperamos viver não só cada momento, mas ter uma verdadeira consciência de nossa existência, nossa maior necessidade e mais difícil realização será encontrar um significado em nossas vidas. (...) A sabedoria é construída por pequenos passos a partir do começo mais irracional. Apenas na idade adulta podemos obter uma compreensão inteligente do significado da própria existência neste mundo a partir da própria experiência nele vivida (...) Hoje, como no passado, a tarefa mais importante e também a mais difícil na criação de uma criança é ajudá-la a encontrar significado na vida"
Lendo estes dois textos, corroboramos o que nosso ritmo de vida já nos afirma - é preciso parar, ter lazer, adquirir um conhecimento além daquele que nos faz produtivos, até porque sem o ócio, paramos mais cedo, vítimas de doenças psicossomáticas e sociais.
Particularmente, fiquei um pouco incomodada quando Russell diz que é a falta de cultura que faz as pessoas se tornarem mais propensas a atos de auto-afirmação violentas, ainda que eu pessoalmente tenha experimentado este fenômeno, como se os líderes de linchamentos e os valentões da escola não tivessem cultura. Todos têm cultura, na medida que todos vivem em sociedade e a cultura é um fenômeno social. Penso que o autor quis dizer cultura nesta noção renascentista de cultivo intelectual.
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1 - BETTELHEIM, Bruno. A luta pelo significado. IN: ------. A psicanálise dos contos de fadas. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1980. p.11-28. (Literatura e teoria literária, 24)

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