domingo, 20 de abril de 2008

Resenha "O narrador"

BENJAMIN. W. O narrador. Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. IN: BENJAMIN,W. Magia e técnica, arte e política. Obras escolhidas. São Paulo: Brasiliense, 3.ed., 1987.

O texto “O narrador”, de Walter Benjamin, traz uma reflexão sobre o desaparecimento do narrador na história da civilização. O autor discorre sobre a importância da narrativa e traz algumas observações bastante pertinentes sobre sabedoria, informação e experiência.
Benjamin parte do trabalho do escritor Nikolai Leskov para defender a tese de que a arte de narrar histórias está em extinção. Para o autor, a guerra fez com que os combatentes ficassem mais pobres em experiência comunicável.
O autor afirma que as melhores narrativas escritas são “as que menos se distinguem das histórias orais contadas pelos inúmeros narradores anônimos”. (p. 198). Esses narradores se dividem em dois tipos: o narrador que vem de longe (figura do marinheiro comerciante) e o narrador que vive sem sair de seu país, e conhece bem a tradição (figura do camponês sedentário). No entanto, Benjamin lembra que a extensão real do reino narrativo só pode ser compreendida se levarmos em conta a interpenetração desses dois tipos.
Ao falar sobre o narrador, seu ofício, sua ligação com o trabalho manual, o autor nos lembra a importância da sabedoria, e principalmente, nos lembra o quanto esse conceito está desaparecendo: “A arte de narra está definhando porque a sabedoria – o lado épico da verdade – está em extinção.” (p. 201).
Benjamin destaca dois indícios da evolução que culminarão na morte da narrativa: o romance e a informação. O romance, diferente da narrativa, está ligado ao livro. Ele não procede da tradição oral nem a alimente. A origem do romance é o indivíduo isolado, que não recebe conselhos nem sabe dá-los. A informação, para o autor, é mais ameaçadora e provoca uma crise no próprio romance. Diferentemente da narrativa, cujo saber vinha de longe, a informação pede uma verificação imediata. Só tem valor no momento em que é nova.
Um dos pontos levantados por Benjamin que chama a atenção no texto é a relação entre a narrativa e o trabalho manual. Para Benjamin, a narrativa é ela própria uma forma artesanal de comunicação, onde o narrador “deixa sua marca” na narrativa contada.
O autor trata da alteração da percepção da morte no século XIX, quando a burguesia produziu, “com as instituições higiênicas e sociais, privadas e públicas, um efeito colateral que inconscientemente talvez tivesse sido seu objetivo principal: permitir aos homens evitarem o espetáculo da morte.” (p. 207). Essa alteração também vai interferir na extinção da narrativa, uma vez que a autoridade daquele que vai morrer e se recorda da vida, está na origem da narrativa. O autor termina o texto retomando a importância da figura do narrador: “o narrador figura entre os mestres e os sábios. Ele sabe dar conselhos: não para alguns casos, como o provérbio, mas para muitos casos, como o sábio. Pois pode recorrer ao acervo de toda uma vida. (...) Seu dom é poder contar sua vida; sua dignidade é contá-la interia. O narrador é o homem que poderia deixar luz tênue de sua narração consumir completamente a mecha de sua vida.”

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